Ary dos santos, nada mais podemos fazer do que confirmar o génio k nele existe...
Queixa e imprecações dum condenado à morte
Por existir me cegam, Me estrangulam, Me julgam, Me condenam, Me esfacelam. Por me sonhar em vez de ser me insultam, Por não dormir me culpam E me dão o silêncio por carrasco E a solidão por cela. Por lhes falar, proíbem-me as palavras, Por lhes doer, censuram-me o desejo E marcam-me o destino a vergastadas Pois não ousam morder o meu corpo de beijos. Passo a passo os encontro no caminho Que os deuses e o sangue me traçaram. E negando-me, bebem do meu vinho E roubam um lugar na minha cama E comem deste pão que as minhas mãos infames amassaram. Com angústia e com lama. Passo a passo os encontro no caminho. Mas eu sigo sozinho! Dono dos ventos que me arremessaram, Senhor dos tempos que me destruíram, Herói dos homens que me derrubaram, Macho das coisas que me possuíram. Andando entre eles invento as passadas Que hão-de em triunfo conduzir-me à morte E as horas que sei que me estão contadas, Deslumbram-me e correm, sem que isso me importe. Sou eu que me chamo nas vozes que oiço, Sou eu quem se ri nos dentes que ranjo, Sou eu quem me corto a mim mesmo o pescoço, Sou eu que sou doido, sou eu que sou anjo. Sou eu que passeio as correntes e as asas Por sobre as cidades que vou destruindo, Sou eu o incêndio que lhes devora as casas, O ladrão que entra quando estão dormindo. Sou eu quem de noite lhes perturba o sono, Lhes frustra o amor, lhes aperta a garganta. Sou eu que os enforco numa corda de sonho Que apodrece e cai mal o sol se levanta. Sou eu quem de dia lhes cicia o tédio, O tédio que pensam, que bebem e comem, O tédio de serem sem nenhum remédio A perfeita imagem do que for um homem. Sou eu que partindo aos poucos lhes deixo Uma herança de pragas e animais nocivos. Sou eu que morrendo lhes segredo o horror de serem inúteis e ficarem vivos.
"...
Original é o poeta
expulso do paraíso
por saber compreender
o que é o choro e o riso;
aquele que desce á rua
bebe copos quebra nozes
e ferra em quem tem juízo
versos brancos e ferozes.
Original é o poeta
que é gato de sete vozes.
Original é o poeta
que chegar ao despudor
de escrever todos os dias
como se fizesse amor.
Esse que despe a poesia
como se fosse uma mulher
e nela emprenha a alegria
de ser um homem qualquer
..."
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